Diálogos da Meia Noite

_ Você quer fazer o pedido?
_ Eu já tinha pedido para o outro garçon...
_ Pediu o que?
_ A morte.
_ De que forma?
_ Não especifiquei... Como vocês têm?
_ Eu vou te trazer o cardápio.
_ Ele já me trouxe. Mas...
_ E a senhora escolheu o que?
_ Agora não lembro exatamente, mas pra mim tanto faz.
_ Sinto muito, mas a senhora tem que fazer o seu pedido.
_ O que a casa recomenda?
_ Para este caso? Todos são muito bons, senhora.
_ Qual o mais pedido?
_ Para ser sincero, não é um item muito solicitado.
_ Ah... não?
_ Não. Não assim de forma tão explícita. Normalmente os clientes pedem como parte de um conjunto de outro pedido. Costumam achar a morte muito forte.
_ Estranho...
_ Temos outras coisas no cardápio, caso queira olhar.
_ Não obrigada. Só vim aqui porque vocês foram super recomendados.
_ Por quem? Era cliente habitué?
_ Pelo que sei, não. Só veio uma vez. Fez o pedido certeiro. Deliciou-se. Morreu e deixou o cartão de vocês recomendando.
_ É. Tem gente que sabe o que quer na vida.
_ Ou na morte...
_ Você sabe qual foi o pedido desta pessoa? De repente pode te ajudar...
_ A morte, imagino... Só não sei te dizer agora de qual espécie. Vocês oferecem tantas...
_ Realmente é nossa especialidade, mas desenvolvemos este cardápio onde as pessoas podem voltar, entende? Como, por exemplo, morte lenta – item 254. Dizem que é muito bom, já que me pediu uma opinião.
_ Quando nasci, ouvi alguém dizendo que aquela era a sensação plena de felicidade. A vida. Tentei entender, mas nunca entendi. Certamente ainda era muito criança para tanto. Chorei. Berrei, mas ninguém me deu atenção. O tempo passou e continuei sentido o mesmo vazio de sempre. Nunca passou. Hoje não posso mais chorar, nem berrar. Tenho que fingir que está tudo bem, que as coisas fazem sentido. Que estou feliz. Mas tenho olhos que gritam e denunciam minha infelicidade. Ninguém nunca me levou a sério. A vida é uma merda, não acha?
_ Desculpe, mas não temos isso no cardápio.  
_ Isso o que?
_ A vida.
_ Entendo... Bom, você sugere o que então?
_ Olha. Eu já morri e te digo, não existe prazer maior nesta vida.

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